08 janeiro 2008

PRÊMIO PINÓQUIO, por Denis Rosenfield

Seguindo a sugestão do Marco, segue, na íntegra, texto de Denis Rosenfield publicado no Estadão.

Acreditar neste governo é pior do que acreditar em mentirosos. Estes, pelo menos, se deixam ver como tais, sem muitos subterfúgios, enquanto nosso presidente e seus ministros agem sem nenhum pudor. O presidente Lula declarou alto e bom som que não aumentaria os impostos, logo após ser derrotado em sua tentativa de prorrogar a CPMF. Chegou a fazer discursos grandiloqüentes sobre a democracia e as virtudes republicanas. Colocou-se em sintonia com o Senado e, sobretudo, com a opinião pública nacional. Desmentiu o seu ministro da Fazenda quando este já anunciava um novo aumento dos impostos por vir. É como se Lula parecesse alinhado com os democratas e os tucanos!

Ora, o mesmo ministro Mantega vem agora a público declarar um aumento dos impostos via elevação do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), com evidente prejuízo para o setor produtivo e para os cidadãos em geral. É como se a palavra nada valesse, sendo de uso descartável. No entanto, na tentativa de manter as aparências, o mesmo ministro Mantega chegou a dizer, e pelo visto sem enrubescer, que "o presidente Lula disse que não mexeria na área tributária em 2007 e de fato não o fez. Estamos fazendo em 2008 e, portanto, está dentro daquilo que foi estabelecido". Deveria ganhar o prêmio Pinóquio!

Ele certamente deve considerar os senadores que fizeram a negociação relativa à prorrogação da DRU como um bando de paspalhos. Na melhor das hipóteses, os senadores não teriam compreendido o significado das palavras, por não estarem à altura da sapiência governamental! Quando o presidente assegura que não haverá aumento de impostos, ele está simplesmente dizendo que, naquele momento preciso, não haverá aumento de impostos, nada prejulgando sobre os minutos seguintes! A sua palavra tem uma validade instantânea, a do tempo de sua enunciação. Fica inclusive a questão: como se pode negociar politicamente se a palavra não tem nenhum valor?

O governo foi derrotado no Senado. A mensagem foi clara: um órgão representativo da soberania popular disse não ao aumento dos impostos. Fazendo ouvidos moucos, o governo passa para um desrespeito manifesto a uma decisão legislativa. E o fez utilizando dois instrumentos claramente discricionários: um decreto e uma medida provisória.

O decreto permite ao Poder Executivo aumentar o IOF sem consultar o Poder Legislativo. Na verdade, trata-se do arbítrio o mais puro, arrogando-se o governo no direito de interferir diretamente nas relações de propriedade. Quaisquer elevações de impostos, contribuições e taxas são nada mais do que transferências de propriedade, o governo apropriando-se de um bem que não é seu. Ele não poderia, de modo nenhum, utilizar um tal instrumento administrativo como se fosse um "direito" seu. Sociedades democráticas foram as que submeteram tentativas desse tipo ao controle do Poder Legislativo. Nossos parlamentares deveriam, nesse sentido, criar um instrumento legal que coibisse tais atos de arbitrariedades governamentais. De um modo geral, deveria valer para todos os atos que afetassem os direitos de propriedade, como, por exemplo, as Instruções Normativas do Incra.

A elevação da CSLL deverá ser feita, conforme anunciado, por medida provisória. Ora, a medida provisória é também um instrumento do governo utilizado para legislar, pois o seu efeito jurídico é imediato, passando a valer no momento de sua edição. O arbítrio reside precisamente no fato de o Poder Executivo passar a atuar como se Legislativo fosse, contando com a anuência de parlamentares que não ousam exercer a sua função. As aparências democráticas são superficialmente guardadas, quando, na verdade, ocorre um tipo de fraude no modo de funcionamento das instituições republicanas. O trâmite legal deveria ser um projeto de lei, que passaria por uma avaliação séria dos deputados e senadores. Cabe, no entanto, o recurso que os senhores parlamentares poderiam utilizar: o da não admissibilidade da medida provisória, por não observar as condições de urgência e relevância. O Congresso Nacional se mostraria à altura de suas funções e a sociedade brasileira se sentiria novamente representada.

Os pinóquios teriam de mostrar os seus narizes!

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