06 março 2009

Mercadante, o covarde

Entrevista do senador Mercadante (aquele covarde que se absteve de votar contra o renan) sobre a eleiçào de Collor para a comissão de infraestrutura do senado (blog Josias de Souza)

- A que atribui a derrota na comissão de Infraestrutura?
A foto daquela sessão é a mesma foto de 20 anos atrás [Em 89, na sucessão de Sarney, Collor pevaleceu sobre Lula]. De 1989 para 2009, muita coisa mudou. Mas a diferença de princípios e de cultura política sobrevive, é a mesma.
- Como assim?
A cena de hoje reproduz 89. Estiveram juntos na sessão, de novo, o Renan Calheiros e o Collor, reforçados pelo PFL, que só mudou de nome. E nós, do PT, tivemos o apoio do PDT e o suporte majoritário do PSDB à indicação da senadora Ideli [Salvatti]. O mesmo PDT que nos apoiou em 89, liderado por Leonel Brizola. E o mesmo PSDB que, em 89, também nos apoiou no segundo turno, sob a liderança de Mario Covas.
- Mas os adversários de ontem não são os aliados de hoje?
É a isso que me refiro quando digo que muita coisa mudou, mas nem tudo. Hoje, o PMDB [de Renan] e o PTB [de Collor] fazem parte da sustentação ao governo Lula. Mas, na sessão da comissão de Infraestrutura, vieram à tona as diferenças de cultura política. Diferenças profundas, construídas ao longo da história.
- Isso não realça ainda mais a natureza esdrúxula dessa aliança de ‘diferentes’?
Somos obrigados a construir alianças, a manter uma coalizão que dê suporte ao governo Lula. Em todos esses anos, foi muito importante a nossa relação com o PMDB. Mas é interessante notar que, em certos momentos, emerge uma linha divisória que é antiga e relevante. E o PSDB, que faz ao nosso governo uma oposição dura, como nós fizemos ao governo deles, consegue captar a importância desses momentos.
- Está insinuando uma nova parceria?
O PSDB, eu insisto, é um partido que faz oposição dura ao nosso governo. Mas existem esses instantes da vida pública que nos aproximam. PT e PSDB não estarão juntos (graças a Deus!!). Temos um papel fundamental na preservação da alternância do poder, que dá previsibilidade ao processo democrático e à governabilidade do país. A disputa das últimas quatro eleições presidenciais se deu entre esses dois partidos. E vai continuar assim. Nós temos dificuldades no governo que eles também tiveram. Dificuldades com as quais nós e eles talvez tenhamos de lidar mais à frente. Essa percepção nos aproxima.
- A fidelidade a Lula não descaracteriza o PT?
Não. Nessa disputa da comissão de Infraestrutura, por exemplo, ficou claro que a nossa identidade está presente. A sociedade nos distingue.
- Não é constrangedor que, depois de ter tido o mandato salvo com a ajuda do PT, Renan invista contra o partido?
Politicamente, isso apenas deixa mais evidente o nosso desafio e o nosso compromisso com a governabilidade. Na vida há problemas que a gente tem que resolver e há fatos com os quais a gente tem de conviver. O Senado é esse que aqui está. Temos de governar sob essas condições históricas. É essa a correlação de forças real. O voto é do povo. O povo é que determina a composição do Congresso. Cabe a nós construir uma governança em torno dessas forças que estão aqui. Objetivamente, o PSDB não nos dá sustentação para a governabilidade. Eles estão voltados para um projeto de disputa. Quem nos proporciona a governabilidade é, fundamentalmetne, o PMDB.
- Vê algum significado prático no gesto do PSDB?
Isso nos mostra que há espaço para uma interlocução em outro patamar em relação a algumas questões. Fomos leais ao PSDB na questão da proporcionalidade, um valor fundamental no Parlamento. Se nós tivéssemos cedido na comissão de Relações Exteriores, o presidente não seria o Eduardo Azeredo [PSDB-MG], mas o Collor, com o nosso apoio. Nós dissemos: ‘Manteremos o direito da bancada do PSDB. E eles sustentaram a mesma posição, majoritariamente, na votação da Infraestrutura.
- Não lamenta a falta de um gesto do Planalto em favor de Ideli?
O que gerou mais perplexidade na nossa bancada foi o ministro da articulação política [José Múcio, do PTB] sair comemorando uma divisão da nossa base que, evidentemente, traz dificuldades para o governo.

Collor, a entrevista

Segue nos dois posts abaixo a entrevista do senador Fernando Collor ao Blog do Josias de Souza.
Muito boa.
Muito triste.

Collor, parte I

- O que pretende fazer na comissão de Infraestrutura?
Transitam pela comissão, além das obras do PAC, o controle das agências regulatórias, o pré-sal... Ela é mais importante do que se imagina. Quero ter uma agenda e um programa de trabalho para o horizonte de tempo de dois anos.
- Que interferência a comissão terá nas obras do PAC?
Nosso papel é o de fiscalização. Desde que foi lançado o PAC, defendo a iniciativa com entusiasmo. Além dos investimentos e dos benefícios que trarão à população, muito mais importante é a iniciativa do governo de liderar o processo de desenvolvimento, como indutor. Leva a iniciativa privada a acordar.
- Acha que o PAC caminha bem?
Em algumas regiões as obras sofrem atrasos. Em outras elas estão adiantadas. Vamos acompanhar de perto a execução, ajudando a fazer andar. A oposição diz que o PAC é mera carta de intenções. Não é assim. As coisas estão caminhando.
- Já falou com a ministra Dilma Rousseff?
Liguei pra ela. Estava embarcando pra São Paulo. Solicitei audiência tão logo regresse. Quero levar ao conhecimento dela o programa de trabalho da comissão.
- Pretende encontrar-se com o presidente Lula?
Acho necessário. Não irei só. A bancada do PTB tem a intenção de solicitar uma audiência. Vamos, mais uma vez, reafirmar ao presidente o apoio do PTB.
- Como foi a articulação que o levou à presidência da comissão?
Começou lá atrás, na costura da candidatura do presidente Sarney. Desde o início, a coordenação das hostes do governo foi falha. Houve muitas falhas.
- Que falhas?
Dizia-se que havia um entendimento, firmado há dois anos. O PMDB presidiria a Câmara e o PT o Senado. A gente sabe que, em política, esses compromissos de antanho não costumam se consumar. Houve uma precipitação do PT.
- Tião Viana não deveria ter disputado?
Não entro no mérito da qualificação do candidato. Mas eles, que falaram tanto em respeito à proporcionalidade, deveriam ter verificado que cabe à maior bancada do Senado, no caso a do PMDB, indicar o presidente da Casa. O PT, de forma açodada, lançou a candidatura.
- Está dizendo que quem quebrou a praxe da proporcionalidade foi o PT?
Foi precisamente o PT. Nunca tive nenhuma dúvida de que o PMDB lançaria um candidato. Lançou o presidente Sarney, que superava os limites da sua bancada.
- Qual foi o papel do PTB nesse processo?
Nas conversas iniciais, optamos pela candidatura do presidente Sarney e, como todas as outras legendas, fomos buscar nosso espaço.

Collor, parte II

- Não se constrange de estar na companhia de um Sarney que, no passado, o sr. chamou de ladrão? Não o incomoda apoiar um Lula com quem teve rixas homéricas e que o chamou de ladrão?
Não me constrange. Se olharmos a história do Brasil, veremos que alianças assim já ocorreram. Getúlio com Prestes. Juscelino com Lacerda... São circunstancias históricas que o país vive e que fazem com que os políticos se unam ou se afastem. Quando cheguei aqui, eleito, em 2006, muitos imaginavam que eu sairia atirando. Mas já havia se passado, em relação ao meu embate com Lula, 18 anos. Em relação ao Sarney, 20 anos. Não seria inteligente, pela experiência que acumulei, que eu viesse aqui transbordar sentimentos menos nobres. Além disso, avaliei: a agenda política, social e econômica do presidente Lula começou lá atrás, em 89.
- Acha que a agenda de Lula é continuação da sua?
Sim. Sobretudo na área econômica. Tudo o que estava preconizado naquela época vem sendo seguido por todos aqueles que vieram depois de mim, inclusive o Fernando Henrique Cardoso.
- Que pedaço do seu governo teve sequência nas gestões posteriores?
Tem um discurso do Fernando Henrique, para mim memorável, em que ele tenta desconstruir toda a linha mestra do nosso programa. E ele, logo depois de eleito, adotou esse mesmo programa.
- A que programa se refere?
Eu me refiro, sobretudo, ao programa econômico. A questão da abertura, a busca do superávit da balança comercial, a inserção competitiva do Brasil no mercado internacional. No essencial, tudo o que veio depois é uma mera continuidade.
- Não acha que a aliança entre políticos que se chamavam uns aos outros de ladrão confunde e desalenta o eleitor?
Não penso assim. Se levarmos em consideração a popularidade de que desfruta o presidente Lula, que não é a mesma de dois anos atrás, eu devo ter tomado a atitude correta. O programa de governo dele tem a aprovação de 80% da população.
- Acha que cometeu excessos no passado?
A gente sempre comete excessos. Outro dia assisti no cinema ao filme ‘O Curioso Caso de Benjamin Button’, com o Brad Pitt. E pensei: Como seria bom se a gente nascesse mais velho, com experiência, e fosse regredindo em idade. Seria uma maravilha. A vida real, infelizmente, não é assim. Então, à medida que o tempo vai passando, a gente vai ganhando experiência com base nos tropeços, nos percalços.
- O senador Mercadante afirma que a disputa da comissão de Infraestrutura refez a cena de 20 anos atrás. De um lado PSDB e PT. De outro o PMDB de Renan Calheiros, recém saído de um escândalo, e Collor. O que acha?
É uma leitura de quem olha a política pelo retrovisor. Vejo como uma justificativa para atenuar a derrota a que ele conduziu o partido dele. A condução do processo foi inteiramente equivocada. Ele e o partido dele perderam a presidência do Senado e a comissão. Ele desconsidera que as pessoas, ao longo dos anos, ganharam experiência, conhecimento, têm melhor visão do mundo, fizeram autocrítica, amadureceram.
- Considera-se mais impuro do que o senador Mercadante?
De jeito nenhum. Não sou mais puro nem impuro do que ninguém. Todos nós, que participamos da vida pública, estamos sujeitos a percalços. Ele próprio foi vitimado por um percalço sério, no caso dos aloprados. O partido a que ele pertence enfrentou problemas sérios com o mensalão.
- Acha que essa disputa terá conseqüências?
O senador Mercadante em nada contribui com a conciliação da base de apoio ao governo. No Senado, o governo tem uma maioria fluida. Ele, como líder do partido que lidera a composição das forças de coalizão, não contribui ao fazer essa análise desfocada. Passada a fase da refrega, temos de virar essa página. Quem não sabe virar a página não merece ler o livro. De minha parte, preferia que não tivesse havido a disputa com a senadora Ideli, a quem respeito muito.
- Não foi indelicado ao dizer que a senadora ‘cisca pra dentro’?
É uma expressão típica do Nordeste. Quem é nordestino sabe que, lá, é uma expressão muito usada.
- Usada com que sentido?
Uma galinha ou um galo, quando cisca em busca de alimento, cisca pra fora, afastando as coisas que não interessam. Ciscar pra dentro significa agregar, conciliar. O sentido é positivo. Quando queremos nos referir pejoritivamente a um político dizemos: ‘Esse camarada cisca pra fora o tempo todo’. É desagregador. Não quis ofender.
- Pretende disputar cargos executivos, governo do Estado ou presidência?
Não há pretensão nem previsibilidade de que isso possa acontecer. Meu horizonte agora são os seis anos que me restam de mandato. No final, verei o que fazer.